À medida que se vai lendo e relendo o projeto do novo decreto-lei que enquadrará, em substituição do 3/2008, os alunos com necessidades educativas especiais, vão-se percebendo algumas das mudanças significativas que com o novo diploma se pretendem introduzir.Uma delas tem a ver com a constituição de turmas. Atualmente, turmas com alunos com NEE que necessitem de acompanhamento individualizado devem conter no máximo dois alunos nestas condições e não podem ter mais de 20 alunos. Pois bem, esqueça-se esta regra. No novo decreto, ficará assim:
Flexibilidade é a palavra de ordem e frequentar uma turma reduzida deixa de ser um direito dos alunos com necessidades especiais, passando a ser, legalmente, uma benesse arbitrariamente concedida pela administração educativa.
Criar uma ou duas turmas mais pequenas implicará aumentar as outras turmas do mesmo ano de escolaridade até ao limite legal – que continua a ser, recorde-se, 30 alunos, a partir do 5º ano – ou, quando mesmo assim não seja possível, pedir uma autorização especial ao ME – que pode ou não ser concedida.
Repare-se que continuamos no reino das discricionárias práticas que obrigam os professores e as direções a fundamentar tudo o que pedem para os seus alunos, mas permitem aos decisores ministeriais negar ou impor sem qualquer critério ou justificação.
Assinale-se a profunda hipocrisia de um normativo todo ele erigido em torno do princípio da inclusão, invocada do princípio ao fim do documento, mas que, na prática, representa um claro retrocesso nas condições que serão proporcionadas aos alunos com NEE para deixarem as salas de apoio específico e irem para as aulas com o resto da turma.
Note-se que este “presente” vem ao encontro de algo que demasiados professores e diretores escolares têm pedido e defendido nos últimos tempos: mais autonomia na constituição de turmas. Sempre me opus a essa pretensão porque ando por cá há tempo suficiente para saber que a autonomia que, nestes contextos, é concedida, é sempre a da gestão da escassez e da falta de recursos. É passar para as escolas o ónus de negar aos alunos mais necessitados as condições e os apoios especiais a que têm direito.
A verdade é que as condições das turmas reduzidas já são, em muitos casos, desrespeitadas, porque o ME não permite a abertura de mais turmas ou obriga a incluir na mesma turma reduzida mais dos que dois alunos. Foram
oito mil turmas ilegais no ano lectivo que agora termina, uma pesada responsabilidade política que o ME, percebe-se demasiado bem, quer diluir na “autonomia” de escolas e agrupamentos.
Fonte:
https://escolapt.wordpress.com/2017/07/16/o-fim-anunciado-das-turmas-reduzidas/