quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Geração ritalina

"A prescrição de medicamentos para tratamento da Perturbação da Hiperatividade com Défice de Atenção (PHDA) aumentou, em todo o mundo, 274%, entre 1993 e 2003. O número de países que começaram a recorrer a este tipo de drogas subiu de 31 para 55. Os dados foram publicados no jornal americano Health Affairs. Uma em cada 25 crianças e adolescentes norte-americanos estão a ser medicamentado para PHDA.
Calcula-se que em Portugal entre seis e oito mil crianças e adolescentes estejam a tomar este tipo de medicação (números de 2006, com base nas vendas). Em 2004, estimava-se que três mil crianças tomassem medicamentos para PHDA, enquanto que em 2003 eram apenas 400."
Revista Pais & Filhos. Edição de maio de 2007. Pág. 102
Metilfenidato é o nome químico de ritalina e concerta, psicoestimulantes usados no tratamento da Perturbação de Hiperatividade com Défice de Atenção (PHDA). O grande aumento no consumo destas substâncias verificou-se em 2004, quando a venda destes medicamentos deixou de pertencer ao domínio das farmácias de certos hospitais e passou a fazer-se em qualquer farmácia. Antes de explorar melhor o significado deste crescimento estrondoso na prescrição de ritalina, parece-me fundamental explorar melhor o que é que diferencia o cérebro de uma criança hiperativa do das outras ditas não hiperativas. A PHDA, segundo estudos realizados, é uma perturbação do desenvolvimento infantil com base neurobiológica, na medida em que os lobos frontais, que são responsáveis por funções executivas, tais como a atenção, a capacidade de antecipar consequências e organizar tarefas, apresentam certas alterações. Estas alterações estão associadas ao facto de a dopamina, que é um neurotransmissor, apresentar níveis inferiores aos normais, o que dificulta a comunicação entre as células. Ao prescrever o metilfenidato, pretende-se aumentar os níveis de dopamina e, consequentemente, melhorar o grau de funcionalidade dos lobos frontais. Esta melhoria, segundo o folheto informativo do concerta, traduz-se pelo aumento da atenção e pela diminuição da impulsividade e da hiperatividade, em doentes com Perturbação de Hiperatividade e Deficiência de Atenção.

A grande questão que se coloca é se existem atualmente mais crianças com PHDA do que antigamente. Sendo esta uma perturbação com uma componente biológica, a sua incidência é, com certeza, a mesma que no passado (cerca de 3% a 5%); o que aumentou foi a capacidade de diagnóstico desta patologia. A quantidade de informação que tem sido divulgada sobre esta problemática é verdadeiramente astronómica, o que conduz a um maior conhecimento e uma maior atenção e sensibilidade por parte das pessoas em geral e dos técnicos em particular para a sua identificação. Note-se, no entanto, que o excesso de informação pode também ter um efeito perverso, pois pode gerar confusão e, consequentemente, falsos diagnósticos de PHDA, pois em cada esquina parece existir um "especialista" nesta área. Só é possível efetuar um diagnóstico preciso quando vários sintomas persistirem por mais de seis meses, em diferentes contextos: familiar, escolar e extraescolar. Para evitar diagnósticos precipitados é, por vezes, necessário que a criança seja avaliada por uma equipa pluridisciplinar, constituída por pediatra, psiquiatra, psicólogo e técnico do ensino especial. A informação fornecida pelos pais e pelos professores, mediante o preenchimento de um questionário relacionado com o comportamento da criança, é também fundamental para a realização de um diagnóstico correto.

Para além do que já foi exposto, existem muitas outras questões às quais é importante dar resposta, tais como: A existência de um fenómeno de "sobrediagnóstico" relativamente à PHDA é uma hipótese a desprezar? Haverá uma procura excessiva e um uso abusivo de metilfenidato? Haverão efeitos secundários a curto e a longo prazo em resultado da ingestão de ritalina? A ação do metilfenidato leva à cura da hiperatividade?

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